Por Redação – 05/07/022
Com trilha sonora de Carlinhos Brown, trabalho foi inspirado pela experiência vivida ao lado de um dos netos da dançarina, diagnosticado com doença genética
Deborah Colkerdedicou seu tempo, nos últimos anos, a buscar uma cura. No caso, uma solução para a doença genética que seu neto tem, a epidermólise bolhosa. Dessa angústia pessoal nasceu o novo trabalho da Cia. DeborahColker,um espetáculo que vai muito além do aspecto autobiográfico. “Cura” trata de ciência, fé, da luta para superar e aceitar nossos limites, do enfrentamento da discriminação e do preconceito. A dramaturgia é do rabino Nilton Bonder e a trilha original é de Carlinhos Brown.
O espetáculo estreou em 6 de outubro de 2021, na Cidade das Artes, no Rio de Janeiro, e passou por nove cidades, com um total de 48 apresentações, e um público total de 50.000. Já a turnê 2022 iniciou com temporada no Teatro Casa Grande, no Rio de Janeiro entre 27 de janeiro e 20 de fevereiro.
Agora o espetáculo retorna ao Rio de Janeiro em temporada popular no Teatro João Caetano. Todas as apresentações do espetáculo “Cura” contam com audiodescrição para deficientes visuais.
A coreógrafa concebeu o projeto em 2017, mas foi no ano seguinte, com a morte de Stephen Hawking, que encontrou o conceito. Embora acometido por uma doença degenerativa, a ELA (Esclerose lateral amiotrófica), o cientista britânico viveu até os 76 anos e se tornou um dos nomes mais importantes da história da física. Deborah percebeu que há outras formas de cura além das que a medicina possibilita.
– Quando foi diagnosticado, os médicos deram a Hawking três anos de vida. Ele viveu mais 50, criativos e iluminados. Entendi o que é a cura do que não tem cura – conta.
A estreia aconteceria em Londres em 2020, mas a pandemia não permitiu. O adiamento deu ao espetáculo mais um ano de pesquisas, transformações e reflexões.
– A pandemia me fez ter certeza de que não era apenas da doença física que eu queria falar. A cura que eu quero não se dá com vacina – afirma.
Há dores mostradas no palco, mas há esperança no final. Ela diz que procurou preservar a alegria necessária à vida. Um ingrediente para isso foi a semana que passou em Moçambique durante a preparação, quando conheceu pessoas que não perdiam a vontade de viver, apesar das muitas dificuldades.
– Fui procurar a cura e encontrei a alegria.
Deborah incorporou ao espetáculo referências das três religiões monoteístas e elementos de culturas africanas, indígenas e orientais. Logo no início, conta-se a história de Obaluaê, orixá das doenças e das curas.
– A ponte entre fé e ciência me ajudou muito. Fui experimentar o invisível, a sabedoria do invisível – diz.
Numa cerimônia realizada quando da morte do seu pai, Deborah conheceu o rabino Nilton Bonder, autor de “A alma imoral” e muitos outros livros. Ao planejar “Cura”, decidiu convidá-lo para desenvolver a dramaturgia. Dentre tantas contribuições, ele ressaltou que “pedir é curar”, ideia que gerou uma cena. Também apontou que “a grande cura é a morte”, o que motivou uma coreografia com dois bailarinos dançando ao som de “You want it darker”, de Leonard Cohen.
– O espetáculo apresenta todos os recursos imunitários e humanitários em aliança pela cura. A ciência, a fé, a solidariedade e a ancestralidade são o coquetel de cura do que não tem cura. Concebido antes desta pandemia, o título não é um “conceito”, mas um grito! – afirma Bonder.
Carlinhos Brownfoi convidado, inicialmente, para compor apenas o tema de Obaluê. Acabou criando praticamente toda a trilha, inclusive a canção inicial, dos versos “Traga meu sorriso para dentro” e “Sou mais forte do que a minha dor”.
– A música veio na minha cabeça logo depois da primeira conversa com Deborah. Eu pensei: “Isso é um chamado, não é uma trilha normal”. É um trabalho muito mais profundo do que “Carlinhos está fazendo uma trilha” – diz o músico.
Ele canta em português, ioruba e até em aramaico. Os 14 bailarinos também cantam, em hebraico e em línguas africanas. É algo que acontece pela primeira vez nos 29 anos de história da companhia.
Fundador da companhia ao lado de Deborah, o diretor executivo João Eliasvê em “Cura” um passo ainda maior que o dado pela coreógrafa no trabalho anterior, “Cão sem plumas” (2017), baseado no poema de João Cabral de MeloNeto.
– Quando começou a coreografar, Deborah era mais abstrata, formal. Depois, passou a contar histórias, aprimorar dramaturgias. “Cão sem plumas” já era um espetáculo visceral, emocionante. “Cura” é ainda mais, mostra um grande amadurecimento – analisa ele.
Companheiro de Deborah em toda a trajetória, o cenógrafo e diretor de arte Gringo Cardiaé outro que destaca a importância de “Cura” para a artista.
– Ela era toda ciência. Passou por um crescimento espiritual. Foi conversar com Deus neste espetáculo – afirma.
Sua assinatura está nas duas rampas que dão aos movimentos dos bailarinos a sensação de desequilíbrio. E está nas caixas que, entre várias funções, formam um muro.
– O muro passa a imagem de um grande obstáculo, mas ele se divide em vários pedaços. Então, é possível atravessá-lo. É como a gente faz nas nossas vidas – diz Gringo.
Nos figurinos de Claudia Kopke – que esteve em “Cão sem plumas” – as pernas podem ter estilos bem diferentes, traduzindo o desequilíbrio que é um dos nortes do espetáculo.
– Os bailarinos têm as cabeças cobertas, usam balaclavas, mas o final é dourado, de alegria – explica.
O iluminador Maneco Quinderé, que só havia trabalhado com a companhia em “Vulcão” (1994), também criou uma luz fragmentada, como sugerem as ideias de “Cura”. O final tem brilho, indicando renascimento.
– Cada segmento tem suas características, e eles formam um caleidoscópio – diz ele.
Ficha Técnica:
Criação, Coreografia e Direção DEBORAH COLKER
Direção Executiva JOÃO ELIAS
Música CARLINHOS BROWN
Direção de Arte e Cenografia GRINGO CARDIA
Dramaturgia NILTON BONDER
Figurino CLAUDIA KOPKE
Desenho de Luz MANECO QUINDERÉ
Assessoria de Imprensa FACTORIA COMUNICAÇÃO
Realização JE PRODUÇÕES LTDA.
SERVIÇO:
Teatro João Caetano. Praça Tiradentes, s/nº, Centro.
Sex., 20h. Sáb. e dom, 18h. R$ 10,00 a R$ 20,00.
Ingressos pelo https://funarj.eleventickets.com
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